terça-feira, 31 de março de 2009

Quem sabe colaborar?

Por aqui na nossa terra é muito comum ouvir críticas à inexistência de espírito de colaboração. Dizemos nós de nós mesmos que somos incapazes de trabalhar em equipa.

Digo eu que essa intolerância é por si só um bom indicador, pois representa uma revalorização do acto de colaborar. Estas reacções são uma demonstração de que existem forças internas que permitem estabelecer limites e apontar novas trajectórias. Estamos a aprender.

Mas também é verdade que este sentimento gera enormes frustrações. A consciencialização dos próprios erros e insuficiências é a fase mais crítica de qualquer processo de mudança. Porque gera perguntas mas não dá respostas; porque gera vontade que não é acompanhada de capacidade efectiva; porque se apresenta como óbvia ao indivíduo, mas nada diz sobre a forma de intervir no colectivo. E, de repente, o tempo urge. E a urgência aumenta a intolerância. E a intolerância crónica gera isolamento. E o isolamento cria um maior desfasamento entre o indivíduo e a sua realização. E assim se desenvolve um padrão comportamental negativo.

Mas estamos aqui e somos o que somos. A recriminação pode servir de bolsa de ar, por um breve período, e a confirmação das nossas altas espectativas de que o desenrolar dos acontecimentos será negativo pode até dar uma sensação de satisfação. A confirmação é uma forma de recompensa intelectual que tende a reforçar as nossas ideias, e, portanto, tende a fechar o nosso mundo num mundo de hábitos e de pensamentos recorrentes. São esse hábitos que estão a ser postos em causa.

Alguns estudos indicam que as exigências relativas à colaboração estão a aumentar: são cada vez mais complexas porque exigem mais colaboradores, maior diversidade de competências e personalidades, maior capacidade de afirmação de cada um, maior capacidade de ajustamento de todos e que todos os membros se mantenham actualizados. Ora, se a realização dos desejos individuais depende da capacidade de realização do colectivo, esta tendência sugere que a dificuldade para implementar colaborações é cada vez maior. A valorização da colaboração é um primeira etapa para responder a essa nossa insuficiência de concretização. Falta agora aprender a colaborar. Não basta o desejo. Não basta a exigência. Não basta a intenção. No que toca à colaboração nós estamos a dar de novo os primeiros passos.

Ao vivermos numa forma de vida profundamente desajustada às necessidade de um mundo complexo criámos esse conflito entre o desejo individual e a capacidade efectiva de concretização da sociedade no seu todo. Esse desajustamento é assinalado quotidianamente pelo alta intensidade das respostas emocionais. Nós estamos dentro dum padrão de hábitos que é conservado pela intensificação das respostas emocionais. E assim não somos capazes de reverter essa insatisfação em trabalho qualificante e em tempo útil. Ou assim parece para alguns.

Sabe-se hoje que bastam pequenas mudanças nos hábitos mentais e comportamentais para que subitamente se crie um movimento cognitivo e social tão alargado e profundo que permite alterar toda a perspectiva que cada um faz da sua envolvente. Do que vejo estamos a entrar num limiar desse tipo. Cá estarei para me regozijar por viver num período tão fértil e entusiasmante.

segunda-feira, 30 de março de 2009

Pensamento nº4 - assimetrias

"O desproporcionado domínio da influência intelectual por parte de um número reduzido de pessoas é ainda mais perturbador porque, ao contrário do desfasamento de rendimentos, não existe nenhuma política social que o consiga eliminar."

Nassim N. Taleb, em Os Cisnes Negros

sexta-feira, 27 de março de 2009

Assimetrias

Frase 1ª: "Os preservativos não são a resposta na luta contra a sida. Na verdade, eles agravam o problema."

Frase 2ª: "É uma crise causada, fomentada, por comportamentos irracionais de gente branca de olhos azuis"

A primeira afirmação é do Papa. Foi muito falada. Indignou muita gente e bem. E é de facto espantoso, mas não inesperado, como alguém com tanta responsabilidade use o conhecimento científico desta forma. A ciência já está a reagir através de uma das publicações mais prestigiadas do mundo na área de medicina, a Lancet. Esta revista exige que o Papa se retracte das suas declarações. (ver http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1371147&idCanal=11)

A segunda afirmação é tão chocante como a outra. Foi há muito pouco tempo que rebentaram guerras mundiais, num período em que todas as pessoas eram classificadas por traços físicos. A ciência desenvolveu uma discipina que classificava toda a gente pelas suas características físicas e associava-as a tendências para o crime, para o alcoolismo, para uma inteligência reduzida, a certas profissões. Foi uma forma terrível de racismo(Sobre este assunto ler "A Guerra do Mundo" de Niall Ferguson). O ódio criado aos judeus e a outras culturas surgiu da repetição deste tipo de afirmações, ditas continuadamente e por um longo tempo, associando-os a tudo o que acontecia de mal na sociedade alemã e noutras nações.

Será que esta afirmação terá o mesmo tratamento nos media, será que indignará tanta gente como a primeira afirmação.

Eu sinto-me igualmente ofendido por ambas. Fico à espera dos desenvolvimentos...

Mas avanço uma hipótese: por ser quem disse, uma figura simpática aos meios intelectuais europeus, a tolerância vai ser muito maior. Vamos ver...

A declaração: http://economia.uol.com.br/ultnot/multi/2009/03/26/04023268CCC18326.jhtm

quinta-feira, 26 de março de 2009

Dúvidas

Como é que se pode organizar uma Escola/ensino que transcenda os limites gerados pela vivência numa cultura com uma identidade forte? Será possível? Ou será possível minimizar os seus efeitos?

Num mundo globalizado o ensino da inter-culturalidade é um benefício? Existe o risco de ser perderem identidades locais? Quais são?

Quais são os impactos dessas abertura para a criatividade? Liberta-a ou é um movimento que nos uniformizará?

hoje à noite

domingo, 22 de março de 2009

Libertar os fantasmas que nos habitam

A sociedade contemporânea está organizada em moldes nunca antes vividos pelo ser humano. Estamos a experienciar algo de único. Após milhares de anos de evolução mental e social os seres humanos acumularam muito conhecimento. E não só pretendem mantê-lo armazenado como disponível para uso social. Mas essa acumulação acabou por tornar necessário desenvolver inúmeras especialidades. Resultado: cada um de nós ficou mais complexo e a nossa envolvente ficou mais complexa. Por outro lado, aumentaram os fluxos migratórios, comunicacionais e de produtos, e, gradualmente, as sociedades tornaram-se multiculturais. O efeito desse processo tem algo de análogo com o acto de baralhar cartas. Tudo se mistura, as zonas de fractura cultural, ética e política deixam de estar organizadas por fronteiras definidas e introduziram-se no seio das relações sociais, quotidianas. Que entraram também como fantasmas dentro de cada um de nós.

Se aceitarmos que os seres humanos são reféns das suas próprias experiências - que o olhar de cada um sobre o mundo depende muito das particularidades dessas experiências - da forma como são vividas e interpretadas - e se aceitarmos o que foi dito anteriormente, então podemos concluir que a nossa normalidade é hoje vivida num ambiente fracturado. Esse é um aspecto caracterizador e factor determinante na forma como são moldadas as nossas vidas, os nossos pensamentos, sentimentos e as nossas relações. Torná-mo-nos numa sociedade de nichos cognitivos. Onde cada um vive no seu. E não poderia ser de outra forma: ninguem é capaz de ser totalidade quando a totalidade é imensa.

No entanto, estas características da sociedade contemporânea pressionam o nosso meio interno para também se inter-culturalizar. Hoje é mesmo impossível organizar a vida assente num conjunto de valores coerentes e essenciais. A actual rejeição filosóficas dessas éticas e a emergência do pós-modernismo, relativista e pluralista, é a reacção natural de uma parte da sociedade que procura soluções para estabelecer uma convivência social mais sã, mas que conserva a vontade de fazer parte de uma sociedade do progresso. Esta será uma nova fase, mais humanista, que se centra na ideia de que são precisos todos para continuar a manter vivo esse nobre objectivo.

No passado, quando na sociedade proliferavam as rotinas de pensamento e comportamento e quando as sociedades estava “arrumadas” no espaço, estas éticas eram adequadas. Mas essas éticas convivem mal com a diversidade. Os indivíduos que se governam por esses pressupostos vivem hoje numa tensão brutal. Vivem sobre uma pressão desintegradora quotidiana. E alguns desses tornam-se brutais, por vezes passivos, por vezes violentos, demasiadas vezes brutais. A expressão “perda de valores” muitas vezes citada é definidora de um sentimento que gera uma enorme frustração e desânimo. Infelizmente ainda há uma mancha de gente, da base ao topo social, que não conseguiu trazer para um lugar relevante do seu cosmos interior toda essa diversidade que não reina mas já convive no seu mundo interior e exterior. Este últimos são simultaneamente os mais agredidos e, paradoxalmente, tornaram-se os maiores agressores.

Não podemos continuar a pretender ser universais. As éticas pluralistas ao valorizar a diversidade permite encará-la como algo benéfico. Mas esse é só o primeiro passo para conviver de forma pacífica, curiosa, com o diferente e com o estranho. São simultaneamente éticas que não pretendem definir a priori trajectórias de vida, nem identidades. Procuram dar um balanço novo à sociedade: promover a convivência entre o nicho e os outros. Esses outros tantas vezes incompreensíveis numa primeira impressão. A sociedade necessita de fazer essa revolução cultural de modo a reverter esse sentimento de perda que se mantém obstinado e a travar a expansão dessas vidas.

Há todo um mundo interno que pode ser explorado, que faz de nós seres suficientemente imensos, cheios de recantos, de lugares por conhecer, fonte de criatividade, onde vivem espelhados e aprisionados os outros. Os outros, estranhos, que já vivem dentro de nós.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Actores sociais - Onde estão? Quem são?

A associação CAIS está neste momento a colocar estas duas questões - onde estão e quem são os actores sociais? - e muitas outras no seu 8º Congresso.

Clay Shirky dá-nos algumas respostas sobre onde estão e quem são os potenciais actores do futuro: - Estão em casa a ver televisão! É aí que está a maior base de recrutamento para a intervenção social em todos os domínios. Tal como ele afirma está aí um elevado "Excedente Cognitivo" das sociedades modernas.

Muitos deles só precisam de um pequeno inventivo outros de um espaço onde possam expor as suas ideias, e, pela visão dos grandes números, basta uma pequeníssima alteração de hábitos da grande massa de gente para modificar o panorama dos recursos disponíveis e provocar grandes impactos (positivos, espero...) ao nível social.

Esse é um recurso por explorar em prol dos agentes sociais que estão no "terreno".

Essa é uma das revoluções necessárias para fazer na mentalidade das populações mundiais: a tecnologia pode ser promotora da intervenção social. Da massa pode surgir UMA grande solução de tempos a tempos; pode vir de um tipo que apenas de dedicou a esse problema um mísero minuto.

quarta-feira, 18 de março de 2009

1%!!!

100 mil foi o número avançado no último programa "Prós e Contras" da RTP1 de portugueses que estão agora em Angola. Equivale a 1% da população portuguesa.

A ser verdade é espantoso! Vivemos num tempo de fluxos, num tempo de oportunidades.

Isto demonstra que há cá quem se atire para as coisas. Que arrisca. Que não está satisfeito e retira consequências dessa situação.

Boa sorte para todos eles!

terça-feira, 17 de março de 2009

segunda-feira, 16 de março de 2009

I HAVE A DREAM

Caro, num post anterior chamas bem a atenção para o período pós 25 de Abril.

É já um consenso, a constatação de que os países que sofrendo as grandes guerras tiveram oportunidade de se reconstruir, de tal modo, que geraram não só riqueza, como bem-estar social. Também nós, temos uma democracia recente e acredita-se que talvez 30\40 anos, sejam suficientes para dissipar as antigas motivações politicas que, naturalmente, incendiaram e continuam a ditar rumos como ponto de orientação num horizonte social que se quer a par da restante Europa.

Há nostalgia, timidez, inexperiência, rasgos de lucidez, iniciativas, e por ai fora. A habitual variedade que se assinala perante a incomensurável imensidão do mundo, de nós própriOs, na medida exacta que simplesmente desconhecemos! Contudo, sinto que comO povo somos uma manta de retalhos. É apenas uma impressão pessoal.

Realizámos ainda muito pouco, acerca da nossa história mais recente, no que toca a produção literária e histórica, estudos sociológicos, ensaio. Igualmente no plano artístico. Insisto que a formação pessoal, será tanto mais rica quanto menos funcional, mas mais HUMANA.

A minha hipótese é a de que temos que fazer a digestão à nossa medida, uma digestão de tudo aquilo que nos tem alimentado ao longo dos anos. E crescer com base nesses nutrientes. Uma teoria de Desenvolvimento Social. Não adianta dizer a um obeso, a um guloso, a um anoréctico o que há-de comer. Pode-se dizer o tempo do come e cala já terminou há muito, para uns – outros nem tanto. Mas mudar uma dieta não é simples e implica uma adaptação gradual e orientada. Há dias em que não se come, outros que se come o dobro, outros que convidamos amigos, outros em que se vive isolado … a pensar que volta dar à vida. È claro que não vou teorizar vagamente sob o infinito de possibilidades. Mas reflectir sob a nossa condição implica termos consciência de nós, e que melhor espelho e possibilidade de crescer por dentro e por fora senão através do exercício quotidiano da nossa escolha, como cidadãos duma comunidade. as decisões - são abruptas, intensamente pessoais, mas o processo gradual e resultado do visivel e do invisivel.

Temos um tempo que nos antecede e que devemos considerar, quer o desafiemos ou respeitemos.

Tudo que se faz tem uma comunidade por referência e necessidade de interpretação nesse nível.

O plano individual é favorecido se articulado com a dimensão colectiva e o contrário também.

Desafios actuais temos muitos, uns mais démodé – a abertura à Europa, a gestão das fronteiras; outros na berra – a falência do sistema capitalista e as suas consequências e impunidades; a governação per se.

Qual a nossa capacidade se pensar em conjunto? Regula-se na exacta medida que nos interrogamos e arriscamos acerca do que fazer individualmente e de mobilizar os nossos mais próximos.

Viver não é passar pela vida, é com que ideias e com quem se passa pela vida e o que juntos fazemos dela. E o que não sabemos, mas desejamos chama-se sonho!

os ânimos estão exaltados?

Neste período de crise os ânimos exaltam-se! Em período pré-eleitoral os ânimos exaltam-se! Estas são conclusões recorrentes de muitos comentadores da nossa praça.

Mais recentemente o PS e alguns meios de comunicação exaltaram-se. Surgiram notícias em catadupa sobre Sócrates, nomeadamente na TVI, e a entourage do PS veio ao terreno defender o seu líder e atacar os meios de comunicação social. Conclusão previsível dos nossos comentadores: Neste período de crise os ânimos exaltam-se! Em período pré-eleitoral os ânimos exaltam-se! Quanto a mim essas conclusões dão a entender que a exaltação é um mal em si mesmo. E isso parece-me pobre, apenas isso.

O que existe nesta questão é uma luta pelo poder. Tem sido frequente ouvir alguns jornalistas a defender que neste enquadramento político são a única oposição efectiva ao governo. Será que essa é a sua missão? Por acaso nós estamos em Angola, na Rússia, na Birmânia? Ou em qualquer outro país onde a liberdade de expressão não é tolerada. Contudo essa retórica já prespassou para alguma sociedade civil. Infelizmente. Basta ouvir muitos professores, por exemplo, que consideram que o governo está a tentar condicioná-los na sua liberdade de expressão. Sentirem-se condicionados é que é uma barbaridade!

Por outro lado diz o dirigente do PS (podia ser outro partido), José Lello (DN, 16 Março, p. 9): "A TVI é a estação que mais abusa da liberdade de informação (...) o seu director já era useiro e vezeiro a manipular a informação quando tinha um cargo na RTP". Aquilo que este político diz não é do tipo: nesta notícia da TVI, do dia tal sobre o assunto tal, sobre Sócrates foram retiradas conclusões que estão muito para além do que as fontes informam. Nem demontra que as fontes não são credíveis. As abordagens podiam ser inúmeras. Todas democraticamente válidas. Acusações genéricas não são.

Quando as avaliações políticas são genéricas e quando as interpretações jornalísticas são demasiado criativas perde a democracia. Porquê? Porque a informação começa a empobrecer - a informação que é a base das escolhas democráticas. Eu vi muitas das reportagens da TVI e as conclusões pareceram-me manifestamente criativas (infelizmente não tenho aqui informação para fazer uma análise mais concreta), estas afirmações vindas de um político do partido do governo sugerem uma tentativa de condicionar o trabalho do visado.

O problema é que este é um problema estrutural da nossa democracia: o facto de termos um governo que administra uma máquina tentacular e uma sociedade civil que se sente asfixiada, fez desta um agente obsessivamente centrado na acção do agente considerado responsável por essa condição (tanto para dizer mal como para pedir ajuda) - o estado e os governos. Estas reacções parece-me provir desta dialéctica que persiste na sociedade portuguesa entre quem tem poder. E que os faz andar distraídos e distrair a própria sociedade civil.

Ao lado desta disputa está a uma sociedade civil que emerge cheia de qualidades, na sombra das janelas mediáticas, mas cheia de força, motivada, com ideias, competente, realista. O que falta é que os seus ânimos se exaltem. Têm de se assumir como agente da mudança. Têm de lutar pelo seu poder: o da sociedade civil.

domingo, 15 de março de 2009

until the end of the world

And we - are criminals that never
broke no laws
And all - we needed was a net
to break our fall

P`la escolha, marchar, marchar!

Os portugueses têm feito escolhas. Mas parece-me que a grande maioria dos nossos concidadãos não valoriza convenientemente essa ferramenta da democracia.

Porque fazem escolhas não significa que as valorizem, significa apenas que o contexto político e social dá espaço para que essas escolhas sejam feitas. Uma grande parte dos portugueses escolheram queixar-se. Pensam sobre a sua vida e queixam-se. Isso é uma escolha. E é uma escolha com profundas consequências. A sua expressividade tornou-se simultaneamente arrogante e passiva: ao avaliar o comportamento dos outros, cheios de impaciência e intolerância, tornaram-se arrogantes; ao fazê-lo sem assumir consequências políticas e sociais dessa expressão, que é o dever de quem sabe e é isso que apregoam publicamente quando julgam e se queixam dos outros, ficaram passivos.

Para muitos isto deve-se à herança do passado. Concordo com essa posição. Durante muitos anos "fomos" proibidos de expressar as nossas inquietações e propostas publicamente. Foi também proibida o direito de associação, o que feriu concerteza a capacidade de organização social, que deixou e deixa um lastro na nossa vivência cultural neste período democrático.

Digamos que essa explicação é certa, mas não pode ser razão para assumir a imutabilidade da nossa cultura. Todas as sociedades têm capacidade de regeneração. De assumir rupturas. Ora, essa disposição "exige" que se olhe para o futuro. Olhando para o que fomos sem nostalgia, e também não como uma fatalidade. Parte desta ruptura depende de um processo de revalorização da cultura portuguesa, que demora tempo e exige muito diálogo. Exige a mudança de muitos comportamentos individuais. Mas é possível do ponto de vista governativo oferecer às pessoas maior capacidade de gestão do seu destino. Assumindo que isso gerará uma valorização social da escolha.

Começemos a valorizar a escolha: deixemos que os pais escolham as escolas para onde gostariam de levar os seus filhos; deixemos que cada pai escolha o nome que quer para o seu filho; assumamos que as obras particulares não têm de ser autorizadas pelo estado; deixemos as famílias e as localidades escolherem parte dos programas escolares; liberte-se parte do dinheiro dos impostos para as autarquias; aumentem-se as funções das juntas de freguesias; desenvolvam-se políticas para regenerar o funcionamento da universidade privada; reduza-se o âmbito dos concursos públicos e responsabilize-se os altos quadros do estado pelas suas escolhas; pare de se proteger de forma tão intensa trabalhadores, empresários, entidades estatais; rejeitem-se discursos fatalistas e unitários dos políticos; etc...

Uma democracia é mais do que um regime político quando a vida social e política desenvolve-se no sentido de aumentar as opções dos seus cidadãos.

sexta-feira, 13 de março de 2009

educar?

Há muito que ando a pensar e a discutir questões ligadas ao sistema de ensino. Ontem tive uma discussão muito interessante! Apresentarm-se em confronto duas visões que divergiam num ponto fulcral - na resposta dada à seguinte pergunta: para que serve o sistema de educação?

Eu defendi uma proposta de redução dos conteúdos de história de Portugal. Palavras que "alertaram" a pessoa com quem discutia, pois considerava incompatível a função da educação, enquanto promotor de certos valores, com a redução da história de Portugal. Para ele essa disciplina é um veículo fundamental de transmissão dos valores da identidade nacional, e esses deveriam estar incluidos no pacote das funções da educação.

Não discordo dos princípios por trás dessa visão. Mas rejeito a ideia de que a consciência da existência de uma história comum seja o melhor veículo de transmissão de valores. Acho até que é, cada vez mais, um empecilho ao nosso desenvolvimento social. Eu não quero formar "bons" cidadãos portugueses, acho mais importante formar cidadãos para o mundo. Cidadãos prontos para lidar com um mundo global, evolutivo, complexo. E por isso cidadãos abertos à conversação e aprendizagem.

Ser português não se ensina teoricamente, vive-se. É-se devido às relações preferenciais que se estabelece ao longo do desenvolvimento. Acho mais importante retirar ensinamentos da nossa história para o fim que estabeleci. E usar a sala de aula como um espaço de construção e aprendizagem, vê-la como um laboratório de cidadãos plurais. Ora isso exige mais tempo por cada episódio, por isso, sobra menos tempo para dar toda a história de Portugal - do dia 0 a 1900 e qualquer coisa. Para mais existem outros veículos para ensinar história: família, museus, informação no espaço público, televisão, net, jornais, revistas, cd-rom`s, clubes, palestras etc. A educação deve ser vista de forma mais global e articulada.

Portanto, defendo menos conteúdo formatado, que é limitante, e proponho mais formação no sentido de promover a afirmação do cidadão português no espaço público, global.

quinta-feira, 12 de março de 2009

in vino veritas

Diziam os romanos que o vinho soltava a língua - e que isso nos induziria a falar verdade.

Não gosto do uso corrente que se faz da palavra verdade. Mas sem vinho ou com vinho o "bisturi" pretende enebriar todos os seus colaboradores, levando-os ao ponto de libertar a língua.

Dizer de sua justiça.

É isso que aqui estamos a fazer.



Vampire Weekend, Oxford Comma

quarta-feira, 11 de março de 2009

já não se percebe esta juventude!!



porque razão ninguém fez posts ao vinho??
estão numa de politicamente correctos?

Como é que é possível?!

Quando estava a tirar a licenciatura tinha um colega que me contou uma história engraçada. Ele vivia em Manteigas e estudava em Évora. Por isso ia pouco a casa. Mas sempre que lá ía a mãe fazia sempre o mesmo comentário: - filho estás cada vez mais magro!...

Ao fim de um ano ele aproximou-se da mãe e disse-lhe, já cansado do comentário: - Mãe, eu já devia ter desaparecido! Quando começei a universidade era magro e estou a emagrecer sucessivamente desde essa altura. Como é que é possível?!

Essa é a questão que quero colocar a muitos portugueses: como é que é possível?!

Como é que é possível que um país, já de si magro, esteja a emagrecer à tanto tempo?

Estou farto do discurso do declínio! Farto!!! Existe para aí uma enorme cambada de queixinhas e maldizentes. Estou farto!!!

Só espero que seja um sintoma de crescimento: está difícil a sociedade portuguesa passar para a idade adulta - a idade onde cada um se afirma pelo que é e faz o que sabe fazer. Temos evoluido em quase todas os sectores, na educação, na sinistralidade, na produção de tecnologia, na oferta de lazer, na produção musical, na saúde, na economia, na ciência, na abertura de mercados como os media, energia, comunicações..., já pagamos mais impostos, exigimos mais aos políticos, criamos associações e sindicatos com capacidade de trabalho e de influência, começam a surgir empresários que apostam na sociedade, já compreendemos o valor da requalificação urbana, estamos na linha da frente na utilização social das novas tecnologias, aceitá-mos rapidamente o telemóvel com parte da nossa vida, concebemos reguladores independentes, criámos uma instituição eficaz na fiscalização do sector económico, etc....

Tudo isto é emancipação social e política. Tudo isto acontece aqui!

Enquanto indivíduos temos demasiados estados d`alma, demasiada crise existencial.

Dá-me ideia de que o país não emagrece porque é colectivamente inteligente.

Mouchão com ternura

terça-feira, 10 de março de 2009

Proponho




FAZ PARTE DA MINHA HISTÓRIA DE VIDA E TORNOU-SE UM HÁBITO!

Se a história do mundo está por se fazer e se somos apenas mais um ponto insignificante no eterno talvez a chave seja seguir o movimento perpétuo e assumir a nossa singularidade entre os nossos pares e fazer valer isso, lutar como se sonhássemos.

Contudo somos personagens fruto de outras histórias.

Todos nós temos uma história e creio que vivemos para a contar.

A linguagem dos sonhos é universal e manifesta-se nas diferentes culturas de modos misteriosos. Contudo temos desistido facilmente dos sonhos e tomamos parte da realidade como toda a vida. Funcionar não é viver, mas é fundamental para viver.

Viva as histórias, as paródias, as zonas misteriosas e obscuras, o que não é óbvio mas é claro!

Proponho abrir uma garrafa e demorarem-se hoje à conversa com quem esteja por ai, ou mesmo sozinhos, ou convidarem alguém ... como preferirem. eu cá vou!

À vossa

segunda-feira, 9 de março de 2009

Somos todos esses turistas

"Estamos convictos, dentro desta moldura metafísica, que não há continentes por descobrir; nem ilhas de refúgio onde buscar miragens paradisíacas; colocados perante a nossa consciências de universalidade, pela primeira vez na história, é-nos vedado erguer andaimes em redor de qualquer felicidade, qualquer justiça, fraternidade ou optimismo; coisas essas que o nosso afã de saber e de criar arrojou ao nada absoluto.
(...)
Vivemos assim, à escala universal, as nossas penas e calamidades, clausurados em limites que sabemos intransponíveis por agora, teimando ao mesmo tempo por transpô-los, com o estratagema da técnica ou da mente, a fim de ir ancorar em sítios menos trágicos, desertos por fugir à condenação daquilo que somos.
(...)
O racionalismo ocidental, vertido sobre toda a Terra, soube formular um ou outro diagnóstico, mas nunca foi capaz de nos brindar uma solução. E as crises que hoje assoberbam os dois regimes, o capitalista e o comunista (movidos embora para mesma metafísica, como dizia Heidegger), são provas acabadas da impossibilidade a que me refiro. Não sabemos assim porque viemos a este estado, e ignoramos para onde vamos."

Vintila Horia, Introdução à literatura do século XX, 1976

domingo, 8 de março de 2009

PAISAGEM TORMENTOSA - Rembrandt



(…) Luciana atirava a um lado e a outro olhares vazios de turista quese desloca para ser visto ou unicamente por esse imperativo de movimento e de acção que é apanágio das formigas, desde séculos imemoriais, e que pode considerar-se o fulcro do espírito ocidental e da civilização vigente. Os turistas são o quarto reino da Natureza, a que preside o sentido da desorientação, são os ímpios da ocasião, e, em geral, os profanadores de muita coisa admirável e obscura, tanto como consagradores de mediocridades. (…)

(Agustina Bessa-Luis )

Com paixão!

quarta-feira, 4 de março de 2009

Ser Humano

nas mesmas noticias ao redor daqueles que comentam o twitter ou o facebook, outras trazem dados de estudos antropológicos e psicológicos que afirmam que as redes socias para funcionarem efectivamente rodam números entre os 30 e 150 elementos. acrescentam que na vida animal a dimensão da rede social depende pois do tamanho e complexidade do cérebro. Outro dado, refere-se à quantidade e regularidade e qualidade que se atribui aos contactos preferencias - às relações intimas - e assentam os autores que as relações protegem independentemente o estatuto socio-económico ou do estilo de vida. tudo indica que manter relações a que se dá valor e relevância fomenta a circulação de experiências e aumenta probabilidade de resoluções de problemas - lato sensu.

comunicar tem sido uma aposta do humano, mas nem sempre cada vez que se comunica se está de facto a dar os tais "saltos" de que falas ricardo. a vontade de resolver problemas é um desafio que por vezes se tende a adiar, tantas vezes face inquietante da contradição e especificidade do nosso cérebro. por um lado evoluido e dotado naturalmente para a curiosidade, prospeção do meio e investigação das soluções. por outro, as necessidades básicas hiperapiziguadas nos circulos ditos desenvolvidos. sem combates, sem desafios que sejam mobilizadores de um "salto" humano. o caçar e lutar de outros tempos podem ter desaparecido e ter gerado um conforto e uma impressão civilizacional mais vasta e segura do que na realidade é - mais fragil, mas no entanto preciosa!

vale isto dizer que comunicar implica o toque, mobilização de musculos e sentidos, pensar e sentir, se tudo isto por ventura não serão apenas e só a mesma coisa.

somos provavelmente bem mais parecidos uns com os outros do que desejariamos. a única hipótese é de nos conhecermos e reconhecermos na mente do outro.o que implica a aposta, o improvavel, avançar para além do limite. criar familia, grupos bem como questiona-los e refunda-los.

facebook ou twitter - nada compete ou invalida a comunicação, nem faz de nós menos humanos e mais máquinas. não substitui a comunicação mas concorre seguramente de algum modo para esse espectro de experiência.

mas tal como qualquer actividade repetida e limitada, dirão alguns torna-se especializada e hipertrofia as outras funções - faz lembrar os perigos da masturbação do principio do seculo passado.

tela - David Hockney

Efectivamente
Gnr
Composição: Rui Reininho

Adoro o campo as arvores e as flores
Jarros e perpétuos amores
Que fiquem perto da esplanada de um bar
Pássaros estúpidos a esvoaçar
Adoro as pulgas dos cães
Todos os bichos do mato
O riso das crianças dos outros
Cágados de pernas para o ar

Efectivamente escuto as conversas
Importantes ou AMBIGUAS
Aparentemente sem moralizar

Adoro as pêgas e os padrastos que passam
Finjo nem reparar
Na atitude tão clara e tão óbvia
De quem anda a engan(t)ar
Adoro esses ratos de esgoto
Que disfarçam ao pilar
Como se fossem mafiosos convictos
Habituados a controlar

Efectivamente gosto de aparência
Imponente ou inequívoca
Aparentemente sem moralizar

Efectivamente gosto de aparência
Aparentemente sem moralizar
Aparentemente escuto as conversas
Efectivamente sem moralizar

Efectivamente….sem moralizar
Aparentemente…sem moralizar
Efectivamente

segunda-feira, 2 de março de 2009

domingo, 1 de março de 2009

O sujeito perante a ambiguidade – parte IV

No passado dia 26 de Fevereiro foi noticiado um estudo no DN que avaliou os efeitos nas relações sociais das formas de comunicação via internet, nomeadamente o Facebook e o Twitter. Diz o estudo que irão alterar as sociedades porque estão a alterar o nosso cérebro. As próximas gerações terão: “menos capacidade de concentração, mais egoísmo e dificuldade de simpatizar com os outros e uma identidade mais frágil”. Este estudo foi apresentado como um alerta. É isso que eu contesto.

Porquê um alerta, porque é que não é uma análise, simplesmente. Por exemplo, como é que se pode concluir que os indivíduos no futuro serão mais egoistas?

Creio que essa visão sofre de miopia. Em parte pela dificuldade em fazer previsões sem aceitar a imprevisibilidade do futuro. Por outro lado, porque demonstra que não estamos abertos à conversação com outras formas de ver o mundo. Quando se avalia o futuro da ética ou qualquer outra coisa existem sempre quatros dimensões em análise: uma ética do presente e um tipo de relacionamento social associado e uma ética no futuro e também um tipo de relacionamento social associado. Estas duas últimas são frequentemente ignoradas. E são apresentadas, implicitamente, como algo que se irá conservar tal como está. Assumindo que no futuro a ética será igual, com as mesmas características do presente. Isso pode estar errado, "O mesmo homem não pode atravessar o mesmo rio, porque o homem de ontem não é o mesmo homem, nem o rio de ontem é o mesmo do hoje.”

Portanto, qualquer previsão terá de contemplar vários cenários possíveis. E aqueles acontecimentos que estão mais longe da nossa lógica são os mais importantes de antecipar, porque menos preparados estamos para os enfrentar. E de os aceitar. Para isso é necessário imaginação e capacidade de lidar com o ambíguo. É a partir deste que se “salta” de um estado lógico, profundamente sentido como normal, para um conjunto de estados lógicos, plurais, abertos a vários cenários. Assim é possível manter uma identidade, mantendo uma capacidade de diálogo com várias outras individualidades, culturas, ...

A ética, ou a falta dela, tal como fala o estudo pode não ser um problema no futuro. Talvez não seja sequer uma questão. Porque a estrutura de relacionamentos e a ética, que domina hoje a nossa cultura, pode evoluir, posicionando-se num outro estado lógico qualquer. Tal como é diferente a ética e a estrutura de relacionamento associada noutras culturas do presente.

Para além disto, este estudo fala sobre um assunto muito interessante.